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Usucapião

Mobirise

A vontade de discorrer sobre a usucapião habitacional de imóvel em favor de ex-mutuário surgiu em decorrência das reiteradas decisões proferidas pela Justiça Federal nas ações de revisão de financiamento habitacional havido pelas regras do sistema financeiro da habitação, frise-se, confirmadas em sede recursal, as quais reconhecem e validam o ato expropriatório praticado pela Caixa Econômica Federal, afastando o interesse de agir dos mutuários para as demandas, que buscam justamente à revisão de cláusulas contratuais, forma de atualização das prestações e demais irregularidades, que inviabilizaram o cumprimento do avençado pelo mutuário. 

Apesar de tais irregularidades saltarem aos olhos ao contrariar o Código de Defesa do Consumidor e Código Civil, em especial os Princípios da Função Social do Contrato, Equilíbrio Contratual, Probidade, Boa-fé e Lesão, o Poder Judiciário reconhece a quitação do débito pendente face à adjudicação do imóvel em execução extrajudicial nos termos do Decreto–Lei 70/66, impossibilitando a revisão pretendida pelo mutuário, mesmo que o ato expropriatório ocorra posteriormente à distribuição da ação revisional, o qual se torna carecedor de ação pela ausência de um dos pressupostos processuais, qual seja, o interesse de agir, ocorrendo, por consequência, o perdimento do bem sem o devido processo legal.

Tornou-se usual e corriqueiro a rescisão do instrumento contratual celebrado com o mutuário com base no Decreto Lei 70/66 arcabouço jurídico criado no estado de exceção, o qual permite a expropriação de bens sem o devido processo legal, representando tal ato, apesar de amparado pela jurisprudência majoritária, um retrocesso aos basilares princípios da ampla defesa, do contraditório e devido processo legal consagrados pelo artigo 5º, LIV e LV da Constituição Federal.

Não obstante a transferência da titularidade da propriedade do imóvel se aperfeiçoar com o ato expropriatório, o mutuário permanece, na maioria dos casos, na posse do bem, agindo como proprietário fosse, arcando com o pagamento das taxas e impostos, cuja situação fática acaba refletindo perante toda a sociedade, trazendo consequências jurídicas, que, para alguns não passa de mero ato de tolerância, enquanto para outros enseja, em favor do ex-mutuário, a aquisição da propriedade pela usucapião desde que preenchidos seus requisitos legais.

Assim, o contrato de mútuo feneratício é usualmente utilizado para o fim de propiciar a aquisição da tão sonhada casa própria, com a utilização, na maioria das vezes, de recursos disponibilizados por programas sociais, gerando sérias consequências face o inadimplemento da obrigação pelo tomador do empréstimo, que deixa de honrar com o compromisso assumido, ocasionando o perdimento do bem dado em garantia.

Apesar de o domínio passar a pertencer ao credor, que se torna o proprietário do bem expropriado, o ex-mutuário, na maioria das vezes, permanece irregularmente na posse do imóvel adjudicado/retomado pela instituição financeira, que, por sua vez, não adota qualquer medida para ser imitida na posse do imóvel, cuja situação fática para alguns não passa de mero ato de tolerância por parte do proprietário, caracterizando a posse precária do possuidor; enquanto que, para outros, cria-se uma nova relação jurídica totalmente desvinculada da negociação anterior, gerando, ao ex-mutuário, um novo direito face à inércia do proprietário, que prolongado, no tempo, pode ensejar o reconhecimento da usucapião, desde que preenchidos seus requisitos legais, em especial a posse contínua, ininterrupta e prolongada, até porque como o próprio nome diz: usucapir é adquirir por uso.

Segundo a Teoria Objetiva, a qual prestigia a utilidade social da propriedade para pacificação social, a usucapião propicia a aquisição do domínio pelo possuidor, o qual utiliza a propriedade de acordo com sua função social, sanando, o tempo, qualquer vício ou defeito do modo de aquisição, eis que, segundo Orlando Gomes, “a razão final” da usucapião é “acabar com as incertezas da propriedade.”

Há que se ressaltar, ainda, que a Caixa Econômica Federal, apesar de integrar a administração pública indireta, se sujeita, neste caso, ao regime jurídico atinente as pessoas jurídicas de direito privado, nos termos do contido no artigo 173 e seus parágrafos da Constituição Federal, estando, portanto, submetida, à usucapião, como outra empresa qualquer, na medida em que os imóveis arrematados não são afetados por lei especial, que os tornem bens públicos.

Nesta linha de convicção, o ex-mutuário, o qual permanece na posse mansa, pacífica e ininterrupta de imóvel habitacional retomado pela Caixa Econômica Federal, pode invocar o reconhecimento/declaração da usucapião, que é uma das formas de aquisição da propriedade, desde que preenchidos os requisitos legais, possibilitando, assim, a proteção do interesse particular como do social. 


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