develop free website

Do atraso na entrega das chaves

Mobirise

Lamentavelmente, o consumidor ainda se depara com práticas abusivas e nocivas praticadas no mercado imobiliário, muito embora, “está o Código de Defesa do Consumidor determinando a aplicação de suas normas de interpretação e de proibição de abusos à grande maioria dos contratos civis hoje existentes na sociedade”.

Tendo-se em vista que o incorporador realiza uma venda antecipada das unidades autônomas, visando justamente arrecadar recursos para a construção da edificação, o consumidor, seduzido pela estratégia de marketing, acaba celebrando um contrato de promessa de compra e venda de fração ideal, frise-se, típico contrato de adesão, que “é aquele cujas cláusulas são preestabelecidas unilateralmente pelo parceiro contratual e economicamente mais forte (fornecedor), ne varietur, isto é, sem que o outro parceiro (consumidor) possa discutir ou modificar substancialmente o conteúdo do contrato escrito.”  

Lamentavelmente, o consumidor ainda se depara com práticas abusivas e nocivas praticadas no mercado imobiliário, muito embora, “está o Código de Defesa do Consumidor determinando a aplicação de suas normas de interpretação e de proibição de abusos à grande maioria dos contratos civis hoje existentes na sociedade”.

Tendo-se em vista que o incorporador realiza uma venda antecipada das unidades autônomas, visando justamente arrecadar recursos para a construção da edificação, o consumidor, seduzido pela estratégia de marketing, acaba celebrando um contrato de promessa de compra e venda de fração ideal, frise-se, típico contrato de adesão, que “é aquele cujas cláusulas são preestabelecidas unilateralmente pelo parceiro contratual e economicamente mais forte (fornecedor), ne varietur, isto é, sem que o outro parceiro (consumidor) possa discutir ou modificar substancialmente o conteúdo do contrato escrito.”

Assim, o consumidor encontra-se impedido de negociar os termos e condições do contrato, limitando-se a aceitar as condições impostas, porém de forma a concretizar o vínculo contratual entre as partes, passando, por consequência, a criar expectativas e desejos, em especial no tocante a entrega das chaves de sua unidade.

Apesar de constar expressamente no contrato celebrado o prazo certo e determinado para a entrega das chaves da unidade adquirida, prevendo, inclusive, prazo suplementar, que geralmente é de 180 (cento e oitenta) dias, o consumidor, na grande maioria dos casos, vê sua expectativa frustrada com o atraso injustificável no andamento das obras, cujo fato impede o cumprimento, do pactuado, pelo incorporador, que, embora ciente da irregularidade praticada, insiste em invocar a cláusula contratual que o desonera por referido atraso, sob a alegação de caso fortuito e força maior. Diante de referida previsão contratual, o consumidor se vê obrigado a buscar o Poder Judiciário, que vem sendo incisivo e categórico ao reconhecer e declarar a nulidade de pleno direito da cláusula contratual limitadora por configurar uma abusividade ao manter o consumidor em desvantagem exacerbada, conforme previsão legal contida no art. 25, do Código de Defesa do Consumidor; não podendo deixar de ressaltar “a boa fé requisito que se exige do fornecedor e do consumidor, gerando, por conseguinte, “transparência e harmonia nas relações de consumo” (CDC, ART. 4º, caput)”.

“A prática abusiva é o comportamento desleal de um fornecedor no mercado de consumo, ou seja, é qualquer atividade empresarial que ocorra antes, durante ou depois de uma contratação, garantindo alguma vantagem exagerada para o fornecedor ou desrespeitando a confiança e a lealdade exigidas em suas relações com o consumidor. Para ser abusiva, portanto, a prática deve estar carente de boa-fé ou induzir ao desequilíbrio da relação do fornecedor com o consumidor, podendo lhe causar prejuízo.”

Assim, o atraso injustificado na entrega das chaves não configura mero inadimplemento contratual, mas, sim, um dano efetivo ao consumidor que teve frustrada a legítima expectativa de usufruir regularmente da casa própria, motivo pelo qual configurado o inadimplemento, inegável o dever de indenizar.

O inadimplemento do construtor desdobra-se em 2 etapas, ou seja, na primeira, acolhe-se a invocação do prazo de tolerância, normalmente contida no instrumento contratual celebrado, desde que o empreendedor não dê causa para o atraso; na segunda etapa, cessado o prazo de tolerância contratualmente previsto, o fornecedor responde com ou sem culpa pelo dano causado pelo atraso na entrega das chaves, eximindo-se de tal responsabilidade de lograr êxito em comprovar a ocorrência de caso fortuito/força maior, rompendo, por consequência, o nexo de causalidade.

Mister se faz, no entanto, ressaltar que caso fortuito deve ser entendido como aquele fato imprevisível, logo, inevitável ocorrido no momento da realização do serviço; não abrigando, por consequência, as excludentes apresentadas pelas construtoras, tais como escassez de mão de obra especializada e fenômenos climáticos, já que tal fato integra o risco da atividade exercida, devendo ser considerados no cronograma de obras.

Assim, os imprevistos surgidos nas obras devem impreterivelmente ser solucionados até o término do prazo de tolerância previsto contratualmente, ou seja, geralmente de 180 (cento e oitenta) dias, sendo, por consequência, correta e adequada à indenização material e moral pleiteada judicialmente pelos consumidores.

O descumprimento contratual configura, sem sombra de dúvidas, dano material face à perda financeira indevidamente suportada pelo consumidor, independentemente do imóvel adquirido se destinar a moradia ou investimento, possibilitando, que o consumidor pleiteie lucros cessantes, pagamento de aluguel e demais dano experimentado, que goza de presunção relativa, até porque, usualmente, os contratos de aquisição de unidade autônoma são omissos quanto à sanção na hipótese de inadimplemento pelas construtoras, evidenciando sério desequilíbrio contratual.

Neste sentido, Nossos Tribunais são claros em decidir que:

“Recurso adesivo. Preparo. Ausência de recolhimento. Deserção decretada. Compromisso de compra e venda de imóvel. Entrega da unidade adquirida pelos consumidores. Obrigação que só se considera adimplida com a efetiva imissão na posse, com a entrega das chaves, e não com a obtenção do “habite-se”. Inadimplemento configurado. Danos materiais. Determinação de reembolso dos valores pagos a título de alugueres. Despesas comprovadas. Danos morais. A frustração de não usufruir do imóvel por período além do previsto contratualmente configura prejuízos dessa ordem e autorizam a indenização pleiteada. Indenização. Arbitramento que deve ser equilibrado e observar o binômio reparação/sanção, considerando as circunstâncias concretas. Verba fixada em primeiro grau que deve ser mantida. Recurso principal não provido, não conhecido o adesivo.” (TJSP Apelação Cível nº 0014098-30.2012.8.26.0564 – voto 28.753)

“Compromisso de compra e venda. Atraso na entrega das obras. Validade da cláusula de tolerância, tal como prevista. Mora mesmo assim configurada, disponibilizado o imóvel aos promissários após o prazo estendido. Lucros cessantes consistentes na impossibilidade de fruição do bem. Indenização cabível. Valor a se apurar em liquidação. Ausência, porém, de danos morais. Sentença revista em parte. Recurso parcialmente provido.” (TJSP Apelação Cível – processo nº 0033317-69..2011.8.26.0562 – voto 5678)

“AGRAVO REGIMENTAL – COMPRA E VENDA. IMÓVEL. ATRASO NA ENTREGA – LUCROS CESSANTES – PRESUNÇÃO – CABIMENTO – DECISÃO AGRAVADA MANTIDA – IMPROVIMENTO. 1.- A jurisprudência desta Casa é pacífica no sentido de que, descumprido o prazo para entrega do imóvel objeto do compromisso de compra e venda, é cabível a condenação por lucros cessantes. Nesse caso, há presunção de prejuízo do promitente-comprador, cabendo ao vendedor, para se eximir do dever de indenizar, fazer prova de que a mora contratual não lhe é imputável. Precedentes. 2.- O agravo não trouxe nenhum argumento novo capaz de modificar o decidido, que se mantém por seus próprios fundamentos. 3.- Agravo regimental improvido.” (STJ AgRgResp 1202506/RJ)

“CIVIL E PROCESSUAL. EMBARGOS DECLARATÓRIOS CUJAS RAZÕES SÃO EXCLUSIVAMENTE INFRINGENTES. FUNGIBILIDADE DOS RECURSOS. RECEBIMENTO COMO AGRAVO REGIMENTAL. COMPRA E VENDA. IMÓVEL. ATRASO NA ENTREGA. LUCROS CESSANTES. PRESUNÇÃO. PROVIMENTO. I. Nos termos da mais recente jurisprudência do STJ, há presunção relativa do prejuízo do promitente-comprador pelo atraso na entrega de imóvel pelo promitente-vendedor, cabendo a este, para se eximir do dever de indenizar, fazer prova de que a mora contratual não lhe é imputável. Precedentes. II- Agravo regimental provido.” (STJ AgRgREsp 1036023/RJ)

“REGIMENTAL. COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. LUCROS CESSANTES. PRECEDENTES. – Não entregue pela vendedora o imóvel residencial na data contratualmente ajustada, o comprador faz jus ao recebimento, a título de lucros cessantes, dos aluguéis que poderia ter recebido e se viu privado pelo atraso.” (STJ AgRg no AG 692543/RJ)

“PROCESSUAL. ACÓRDÃO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. JULGAMENTO MONOCRÁTICO. INTERPOSIÇÃO. AGRAVO INTERNO. APRECIAÇÃO. COLEGIADO. PREJUÍZO. AUSÊNCIA. CIVIL.COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA. ATRASO NA ENTREGA DO IMÓVEL. LUCROS CESSANTES. CABIMENTO. QUITAÇÃO PARCIAL. PROPORCIONALIDADE. ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA. INEXISTÊNCIA. I- A competência para julgar embargos de declaração opostos a acórdão é do colegiado que o proferiu. Contudo, se, por meio do agravo interno, a impugnação acabou sendo apreciada pelo órgão competente, não ocorre prejuízo à parte, razão pela qual não se declara a existência de nulidade. Precedentes. II- A arguição de afronta ao artigo artigo 535, incisos I e II, do Código de Processo Civil, deve indicar os pontos considerados omissos e contraditórios, não sendo suficiente a alegação genérica, sob pena de aplicação do enunciado 284 da Súmula do Supremo Tribunal Federal. III- Conforme entendimento desta Corte, descumprido o prazo para entrega do imóvel objeto do compromisso de compra e venda, é cabível a condenação por lucros cessantes. Nesse caso, há presunção de prejuízo do promitente-comprador, cabendo ao vendedor, para se eximir do dever de indenizar, fazer prova de que a mora contratual não lhe é imputável. Não há falar, pois, em enriquecimento sem causa. Recurso não conhecido, com ressalva quanto à terminologia.” (STJ REsp 808.446/RJ)

Conclui-se, assim, que o descumprimento imotivado do prazo para entrega do imóvel gera, ao fornecedor, o dever de indenizar o dano material experimentado pelo consumidor, sendo certo que tal premissa, com relação ao dano moral, vem, atualmente, ganhando força em nossa jurisprudência, a qual deixou de adotar o entendimento de que tal atraso gera apenas um mero dissabor, ou seja, transtornos próprios da relação contratual, adotando posicionamento de que a conduta praticada pelo fornecedor, independe do dano material sofrido, ferindo direitos personalíssimos do consumidor, tais como sua liberdade, honra, reputação, entre outros, causando dor, angústia, tristeza, sensações e emoções negativas.

Diante de tal quadro, referido atraso suplanta os meros dissabores do cotidiano, atingindo direito fundamental à moradia ao colocar em risco o investimento e a segurança patrimonial do consumidor; razão pela qual o não reconhecimento do dano moral indenizável decorrente de tal inadimplemento contratual premia a malícia, o ardil, o ilícito praticado pelo fornecedor, que, ao celebrar qualquer tipo de instrumento contratual, deve ser pautar pelos princípios da boa fé objetiva, abandonando o velho conceito da obtenção de vantagem em tudo, lamentavelmente, ainda enraizada em nossa cultura.

A fim de evitar referidos abusos, os Tribunais vêm decidindo que:

“Compromisso de compra e venda de imóvel. Atraso na entrega da unidade adquirida pelos consumidores. Excludente de responsabilidade não configurada. Mora da fornecedora. Ausência de cláusula penal. Lucros cessantes. Consumidores que não puderam usufruir do bem. Prejuízos presumidos que merecem ser indenizados. Determinação para que se apurem em liquidação por arbitramento, com base no valor de locação do imóvel. Danos morais. A frustração de não usufruir do imóvel por período além do previsto contratualmente configura prejuízos dessa ordem e autoriza a indenização pleiteada. Precedentes. Indenização. Arbitramento que deve ser equilibrado e observar o binômio reparação/sanção, considerando as circunstâncias concretas. Recurso provido.” (TJSP Apelação nº 0008192-72.2012.8.26.0010 – voto 28.778)

“COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA – Imóvel – Inadimplemento da ré – Atraso na entrega da obra de imóvel residencial – Cláusula penal convencionada entre as partes muito inferior ao real prejuízo sofrido pelo consumidor – Multa baixa que teria o mesmo efeito de cláusula de não indenizar por vício do produto, o que viola o sistema cogente do CDC – Dever de indenizar – Dano Moral – Ocorrência – Autora que deveria ter recebido o apartamento em 2.010, e até hoje não foi imitida na posse do bem – Ação parcialmente procedente – Recurso improvido.” (TJSP Apelação Cível nº 0179701-29.2011.8.26.0100 – São Paulo – voto nº 21.071 AFS 2/11)

Diante do sistema adotado pelo Código de Defesa do Consumidor, a cláusula contratual inserida nos contratos imobiliários, as quais excluem a responsabilidade do fornecedor pelo atraso na entrega das chaves do imóvel, é nula de pleno direito, eis que totalmente abusiva, representando séria e inegável desvantagem ao consumidor, que possui direito em obter a devida reparação do dano efetivamente suportado, seja ele de cunho material e/ou moral. 


Site by Jundweb